A mulher do marqueteiro João Santana, a publicitária Mônica Moura, disse em depoimento à Polícia Federal nesta quarta-feira (24) que os US$ 3 milhões que a empresa do casal recebeu via caixa dois da Odebrecht em conta no exterior eram pagamentos de dívidas de campanhas realizadas em três países: Angola, Panamá e Venezuela.
A estratégia do casal de admitir recebimento de recursos irregulares fora do país foi revelada nesta quarta-feira (24) pela Folha.
De acordo com o depoimento de Mônica, prestado em Curitiba, os US$ 4,5 milhões pagos pelo lobista Zwi Skornicki também têm origem em negócios no exterior.
Segundo ela, ao cobrar o MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola), partido para o qual Santana dirigiu a campanha presidencial em 2012, ouviu da sigla que o pagamento seria feito por Skornicki.
Santana e Mônica foram presos pela Polícia Federal nesta terça-feira (23), depois de terem a prisão decretada pelo juiz federal Sergio Moro, sob acusação de recebimento de US$ 7,5 milhões ilegalmente no exterior.
O valor equivale a cerca de R$ 30 milhões e não foi declarado à Receita Federal pelo casal ou pelas empresas das quais eles são sócios.
Skornicki também foi preso na 23ª fase da Operação Lava Jato, batizada de Acarajé porque era esse o termo que funcionários da Odebrecht usavam para designar propina, de acordo com a PF. Engenheiro e lobista, ele representa no Brasil os interesses de um estaleiro de Cingapura, Keppel Shipyard.
Ao ser questionada pelos policiais sobre por que um lobista que atua na Petrobras pagaria as contas de um partido de Angola, Mônica afirmou não saber quais eram os interesses comerciais do lobista no país africano.
O estaleiro para o qual ele trabalha tem contratos naquele país para fornecer plataformas de exploração de petróleo em alto mar, de acordo com o site da Keppel.
Só um desses contratos, assinado em 2012 para a reforma de plataformas que seriam alugadas por 12 anos, foi de US$ 170 milhões (R$ 673 milhões, em valores atuais).
A Folha revelou em maio do ano passado que a PF de São Paulo investiga as relações de Santana com Angola, sob suspeita de lavagem, o que o marqueteiro nega.
A Polícia Federal e os procuradores da Operação Lava Jato suspeitam que os US$ 3 milhões pagos pela Odebrecht a João Santana possam ter relação com campanhas petistas e com desvios da Petrobras, o que a defesa do marqueteiro rechaça.
Santana dirigiu a campanha de Lula em 2006 e as de Dilma Rousseff em 2010 e 2014. Desde 2002, o marqueteiro recebeu R$ 229 milhões, em valores atualizados, de campanhas do PT, entre as quais a de Fernando Haddad (PT) para a prefeitura de São Paulo, em 2012.
AS SUSPEITAS
A suspeita dos investigadores baseia-se em anotações encontradas no celular de Marcelo Odebrecht, ex-presidente do grupo homônimo, que está preso desde junho do ano passado.
Nas anotações, Marcelo fala em supostos valores a “Feira”, que seria um codinome para designar o marqueteiro, em referência à cidade Feira de Santana (BA), vizinha do local onde ele nasceu, chamada Tucano.
A PF quer que Marcelo explique o significado dessas anotações, mas seu advogado pediu que seu cliente tenha acesso às investigações da 23ª fase da Lava Jato para depois se explicar.
O advogado de Santana e Mônica, Fabio Tofic Simantob, disse que o único crime que o casal cometeu foi manter valores não declarados no exterior. “Não existe nenhum brasileiro preso por manter contas no exterior. Os recursos que eles receberam eram lícitos, por trabalhos que eles prestaram em campanhas políticas”, afirmou.
Santana elegeu sete presidentes na América Latina e na África. Na Venezuela, por exemplo, ele atuou nas campanhas que elegeram Hugo Chavez e Nicolás Maduro. No mesmo ano, dirigiu a campanha vitoriosa de José Eduardo dos Santos, que está no poder desde 1979.
Em 2014, ele comandou a campanha de José Domingo Arias à Presidência do Panamá e foi derrotado.
Os policiais preferiram ouvir primeiro a sua mulher porque é ela que cuida da administração e da contabilidade das empresas do casal, enquanto ele responde pela parte criativa e estratégica das campanhas. O depoimento de Santana está marcado para esta quinta-feira (25).
OUTRO LADO
A Odebrecht afirmou que não teve acesso ao teor do depoimento e por isso não pode comentá-lo. A reportagem não conseguiu localizar assessores de Zwi Skornicki no Rio de Janeiro.
Colaborou JULIANA COISSI, de Curitiba
Editoria de Arte/Folhapress | ||
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