Dejard Martins: Competência, dinamismo e seriedade

A rua Dejard Ramos Martins e suas travessas são artérias bucólicas para os padrões de movimento do histórico Bairro de Fátima, local que foi palco de muitas das minhas noites de boemias,  sintetizando meu amor pelo berço da minha querida Unidos de Fátima. Mas não estou aqui para escrever sobre a escola de samba do meu coração  e nem para  me aprofundar sobre aquele reduto festeiro, onde incontáveis noites  e madrugadas  embalaram  parte de minha juventude.

Decidi escrever sobre uma proeminente figura do esporte, da comunicação e da política maranhense. Dejard Ramos Martins. Este é o cidadão em questão. Seu nome está  associado ao bairro, porque ali  funcionou a Rádio  Timbira

emissora que dirigiu na década  de 1960, dando-lhe nova dinâmica e imprimindo sua marca de grande gestor.

Nasceu em 14 de julho de 1923 em Manaus, filho de Joaquim de Souza Martins com a maranhense Anelide Ramos Martins.

Veio para o Maranhão em 1935 e, apaixonado pelo futebol, em 1940 foi nomeado diretor de futebol do Sampaio Correa, seu time do peito. Seria o início de uma brilhante trajetória, que o levaria a ocupar diversos cargos importantes, sempre pautado pela seriedade e competência. O Brasil, a ditadura de Getúlio Vargas e o Maranhão estava sob o comando do interventor Paulo Ramos, homem de pulso forte e que foi o responsável pelo pedido de concessão  para criação  e instalação  da Rádio Timbira do Maranhão.

Num discurso proferido na  Câmara dos Comuns do Reino Unido, em 20 de agosto de  1940, em plena Segunda Guerra, o primeiro-ministro britânico Winston Churchill cunhou sua famosa e histórica frase:  “Nunca, no campo do conflito humano, tantos deveram tanto a tão poucos”, referindo-se aos esforços em curso da Royal Air Force e outras tripulações aliadas que estavam lutando na Batalha da Grã-Bretanha. Ele direcionava sua frase aos soldados, que atuavam bravamente em defesa da população britânica, que vinha sendo severamente bombardeada pela Luftwaffe, a temida força aérea alemã.

 

Utilizo essa frase ao contrário, pois sou apenas um a dever a tantos. E um dos meus queridos e saudosos  credores foi Dejard Martins, que me prestou inestimável ajuda, num momento extremamente necessário para  minha sobrevivência.

O conheci em 1979, quando ingressei no extinto O JORNAL, onde    ele era o superintendente. O referido matutino tinha ainda como diretores, Mauro Bezerra,  seu amigo inseparável,  Cordeiro Filho e Ruy Ilaino Coelho de Abreu.

Cheguei para trabalhar como revisor, na parte da tarde. Ocorre que estava mesmo focado era em ser repórter  e redator. E o acaso me colocou nessa trilha. Numa manhã de segunda-feira, havia ido ao jornal levar minha Carteira Profissional para ser assinada. Eis que ali chega, esbaforido, o atual técnico de futebol Braide Ribeiro, cuja carreira já o levou a treinar  equipes  até no exterior.

Me disse que queria ser entrevistado, porque acabara de se formar na UFMA, em Educação Física e estava retornando de um estágio na equipe do Flamengo do Rio de Janeiro. Não havia repórter na redação, mas não o desapontei. Chamei o Silvan Alves, um dos fotógrafos e fiz a entrevista.

Levei o texto e as fotos para o Dejard tão logo ele chegou.

-Muito bom! Vai ser a manchete da página de esporte e com chamada na primeira página. Liga pro Braide e diz que quero falar com ele-, me determinou.

Como era novato e ele não me conhecia, foi posteriormente indagar ao Jersan sobre quem eu era. Foi informado de que era revisor e que só trabalhava  à noite. Não demorou muito e depois de algumas matérias produzidas por conta própria, fui promovido para a redação.

 

Em 1980, O JORNAL foi incorporado ao Sistema Difusora e eu fui enviado para Imperatriz, para dirigir  a redação do JORNAL DO TOCANTINS, criado pelo grupo. O  ex-deputado deputado federal Hildo Rocha era o administrador e o Silvan Alves o fotógrafo. Lá montamos a equipe, contratando o Marcelo Rodrigues, que já havia atuado na Rádio Difusora, o Nilson Santos, para a reportagem policial e, de São Luís, foi também o Iran de Jesus dos Passos Rodrigues, atualmente professor-doutor do curso de Letras da  Universidade Estadual do Maranhão (UEMA).

 

Quando deixei Imperatriz e voltei a São Luís, o JORNAL DO TOCANTINS estava consolidado, e na capital, entrei em rota de colisão com o Afonso Bacelar, poderoso diretor do Sistema Difusora. Acabei demitido. Enfrentei agruras. Meu primogênito, Marco Aurélio estava com poucos meses de nascido e minha situação financeira era crítica. A solução foi mandar ele e a  mãe, Anilza para uma temporada na casa da família dela, mo povoado Parati   interior de Guimarães, até que as coisas se arrumassem por aqui em São Luis.

Fui ao JORNAL PEQUENO e expus minha situação ao saudoso Ribamar Bogéa, que me socorreu de pronto. Passei a trabalhar como freelancer, na área de esportes, recebendo o salário em parcelas semanais, o que começou a modificar a situação.

Era uma manhã de sábado, ainda em 1980. Eu  havia descido do ônibus da linha do Anjo da Guarda, ao lado do Mercado Central, quando vi o Dejard Martins e o chamei. Me atendeu sorridente, procurando como estava minha situação, Contei o meu drama e ele foi direto ao ponto:

-Na segunda-feira, vem ao SIOGE e traz logo tua Carteira Profissional. Vais trabalhar na revisão. SIOGE  é o extinto Serviço de Imprensa e Obras Gráficas do Estado, que, antes da Constituição de 1988, detinha o monopólio dos serviços de impressão de todos os órgãos estaduais. Funcionava na Rua Antônio Rayol, próximo ao Mercado Central, num prédio histórico que hoje está em ruínas, mesmo já sendo propriedade da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), que anuncia, em gigantesca placa, que ali funcionará o curso de Arqueologia.

Ele era a segunda pessoa na linha de comando. Quem presidia a autarquia era o Ruy Ilaino Coelho de Abreu.

Passei o sábado e o domingo quase sem dormir, de tanta felicidade e expectativa. Na segunda-feira, acho que fui a primeira pessoa a chegar ao meu futuro local de trabalho. Fui apresentado ao Edilson Lins, diretor industrial, que me levou à sala onde trabalharia, no período o chefe do setor era o destacado poeta, jornalista e escritor Herberth de Jesus Santos, que já o conhecia do Anjo da Guarda e de noites de boemia.

Herberth havia  concluido o curso de Comunicação Social na UFMA e meses depois foi transferido para a Secretaria de Administração. O Dejard me promoveu para a chefia,

Fiquei no cargo até o final do governo João Castelo. Seu sucessor, Luiz Rocha, nomeou para a direção do órgão o administrador  Francisco Alves Camelo, meu amigo. Ele pediu que permanecesse na função, mas já havia acertado com o então deputado Carlos Braide, pai do prefeito Eduardo Braide, que iria assessorá-lo na Secretaria de Estado de Ação Social, como aconteceu durante os quatro anos seguintes.

 

 

Dejard Martins foi um homem de múltiplos talentos, que marcou sua trajetória pela competência, dedicação e seriedade em tudo o que fez. No final da década de 1940, o futebol maranhense passou por radicais transformações. Foi o período em que os grandes clubes, como Sampaio Correa, Maranhão Atlético Clube (MAC)  e Moto Clube se profissionalizaram, em decorrência do incentivo do industrial César Aboud, homem que dava as cartas no Moto. Dejard Martins já tinha ligação com o futebol, através do Sampaio, onde chegou a ser diretor e técnico. Seguia os passos do pai, que foi diretor do MAC e assumiu a presidência do clube em algumas ocasiões.

Em 1949, Dejard, seu irmão, Walbert Ramos Martins, o lendário locutor esportivo Canarinho e os amigos Abraão Sekef Filho e Jaime Barbosa Filho, jogavam bola no quintal da residência da sua família, quando decidiram  articular a abertura de um espaço dedicado ao futebol na Rádio Timbira.

Nasceu o programa “ATUALIDADES ESPORTIVAS” . Dejard ficou  responsável pelos comentários e adotou o pseudônimo Oliveira Júnior, Sekeff Filho apresentava as resenhas e narrava os jogos e Jaime Barbosa era o responsável pelo rádio escuta. Aquele que escutava os jogos de outros estados e anotava os resultados para a divulgação local.

Começava, aí, a brilhante trajetória desse homem extraordinário. Tanto na área esportiva como no serviço público. Em 14 de dezembro de 1947, na busca de melhores momentos para a radiofonia do Maranhão, fundou a Associação dos Cronistas Esportivos do Maranhão embrião da atual Associação Maranhense dos Cronistas e Locutores Esportivos do Maranhão (ACLEM).

Nessa jornada, estiveram ao seu lado Sekeff Filho, Benito Neiva, Ferreira Baty, José Ribamar Bogéa, Mário Frias e Luís Lílio do Rego.

Atuou ainda nas rádios Difusora, Ribamar (onde foi superintendente) e Educadora. Em 1963, como diretor da Rádio Timbira, decidiu investir em profissionais de outros estados e trouxe, da Teresina, Herberth Fontenelle e Mauro Bezerra. Também trabalhou em jornal impresso, participando das equipes do JORNAL  DO POVO, DIÁRIO DA MANHÃ e como correspondente da Gazeta Esportiva, de São Paulo.

Com o nome consolidado e muito respeitado por todos os segmentos sociais, Dejard Martins, que já desempenhava a função de auditor fiscal do município, foi nomeado prefeito de São Luís, pelo governador Newton Belo, em 1965, substituindo a Costa Rodrigues, que se desincompatibilizou para concorrer ao governo do Estado, sendo derrotado por José Sarney,

Dono de uma irretocável biografia, desempenhou muitas funções no serviço público.  Em 1943, ingressou no Estado via concurso. Foi diretor de Divisão de Pessoal do Serviço Público no governo de Eugênio Barros, secretário municipal de Administração na primeira gestão do prefeito Costa Rodrigues e  chefe de gabinete e posteriormente secretário de Fazenda na administração do prefeito Carlos Vasconcelos.

Na administração do prefeito Otávio Barros, foi secretário de Educação, cargo que voltaria  a exercer durante o mandato do prefeito Erasmo Dias. Na segunda gestão de Costa Rodrigues, foi secretário de Fazenda, cargo que retornaria com Ivar Saldanha. No SIOGE, foi  assessor-chefe no governo de João Castelo e diretor administrativo e financeiro com Epitácio Cafeteira.

Diretor Geral da Assembleia Legislativa, com Ivar Saldanha, presidente da Companhia Industrial de Produtos Agropecuários do Maranhão (COPEMA), no governo João Castelo. Também assumiu, nas gestões municipais de Jackson Lago, importantes cargos, como assessor especial da Secretaria de Fazenda, secretário adjunto da mesma pasta e secretário geral da Secretaria Municipal de Governo.

Representou o Maranhão na FUNDAÇÂO CASPER LÍBERO, editora dos jornais GAZETA e GAZETA DE NOTICIAS. Através da instituição, promoveu, em São Luís, durante  muitos anos,  as preliminares da Corrida de São Silvestre.

Uma figura extraordinária, eclética, muito sensívelesolidária, desprovida de vaidades. Extremamente inteligente e ao mesmo tempo austero em suas ações. Homem de desafios. Não admitia fracassos. Prestou relevantes serviços ao município de São Luís e ao Maranhão. Em 1999, nos encontramos num evento. Me disse que tinha um livro sobre  futebol a ser lançado e queria que eu fizesse a revisão. Aceitei a tarefa com o maior prazer e orgulho, mas jamais recebi os originais. Ele morreria no ano seguinte.

Para mais informações sobre a vida de Dejard Martins, recorri ao filho dele, o Jesus, que me  subsidiou. Tenho uma grande e eterna  dívida de gratidão. Costumo dizer que o Maranhão tem um grande débito para com Dejard Ramos Martins.

Faleceu em São Luís em 11 de novembro de 2000, de causas naturais e deixando um grande legado para esta e as gerações futuras.

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