Disputa territorial é a principal causa de ataques a índios no Maranhão

O clima tenso entre os indígenas e os moradores que vivem em regiões próximas à BR-226 no Maranhão não é recente. Segundo entidades de proteção à causa indígena, o ataque que terminou com a morte de dois índios da etnia Guajajara e o ferimento a outros dois é o resultado de interesses que vão de encontro à preservação da Terra Indígena Cana Brava.

Os índios foram atacados a tiros por pessoas que estavam em um carro branco quando saíam de uma reunião na Eletronorte. Segundo relato das vítimas, o carro identificou os indígenas em motos quando trafegavam pela BR-226, em Jenipapo dos Vieiras, entre as aldeias Boa Vista e El Betel. Os caciques Firmino Silvino Guajajara e Raimundo Bernice Guajajara foram mortos. Outros índios ficaram feridos e foram socorridos.

Depois do ataque, as primeiras informações que chegaram as autoridades davam conta de que o problema seria causado pela insatisfação de moradores da região por conta de assaltos. Os índios atacados teriam sido confundidos com bandidos que agem na região. Entretanto, esta versão é contestada por entidades que acompanham a causa indígena no Maranhão.

O G1 ouviu autoridades sobre o assunto e algumas disseram que os problemas de assaltos não são o motivo principal desse relacionamento ruim. A Terra Indígena Cana Brava fica perto de municípios como Jenipapo dos Vieiras, Barra do Corda, Grajaú e Itaipava do Grajaú.

Para a Sociedade Maranhense de Direitos Humanos, “existe preconceito grande nas cidades vizinhas, desde o período das demarcações (das terras para os índios). Esse preconceito está sendo incentivado com mais força agora. Tem um histórico de interdições da rodovia pelos indígenas em função de reivindicações a respeito de várias demandas e as interdições agravam o ódio dos não-indígenas”.

Durante o domingo (8), os indígenas estiveram reunidos com autoridades como secretários estaduais e das polícias Civil e Federal. Entre as reclamações, alguns disseram que são alvos de comentários e acusações de cometimento de crimes por pessoas que estão em grupos de conversas em aplicativos e moram nas cidades próximas a terra indígena.

 

O advogado João Coimbra Sousa também se manifestou neste sentido. Ele é consultor no Brasil para organização ambiental e de direitos humanos da Amazon Watch e diz que as populações indígenas politicamente organizadas oferecem resistência a interesses de mercado e a relação ruim pode ser resultado disso.

“O interesse de expulsar e de desorganizar as populações indígenas, que protegem a floresta, tem o motivo político, mas a gente observa também o motivo econômico, pois tem os interesses do mercado da madeira, do minério e da abertura de pastos para o agronegócio. E essas terras não são fáceis de explorar se as populações indígenas são politicamente organizadas, pois elas protegem o território, como é o caso da população Guajajara”, disse João Coimbra.

O consultor também analisa que a situação pode ter motivação política e relacionou os últimos episódios à postura do governo federal sobre o assunto.

“Existe um interesse, que não é velado, de criminalizar as populações indígenas e torná-las vítimas de novo usando assaltos e outras pequenas acusações para que se justifique o genocídio atual contra os indígenas. O certo é que desde o começo desta nova gestão no governo federal, os observatórios registraram um aumento considerável nos ataques a índios. Até setembro já tinha superado os ataque de 2018 em terras indígenas”, concluiu.

Luiz Eloy Terena é assessor jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB). Ele é indígena do Povo Terena e acompanha de perto a situação dos conflitos indígenas no Maranhão. Para ele, a relação com este ataque na BR-226 não foi causada por conta dos assaltos na região.

“Ali onde habitam os Guajajara é uma área de intenso conflito, tanto que os indígenas formaram um grupo chamado de ‘Guardiões da Floresta’. E este acirramento só aumentou por conta do atual governo (federal), que diz que não vai demarcar nenhuma terra indígena e que esses territórios estão aí para serem explorados”, disse Eloy.

Segundo, Luiz Eloy, o crime que terminou com a morte de Paulo Paulino Guajajara de alguma forma tem relação com esse novo atentando.

 

“Teve a morte do Paulino Guajajara, que era o líder dos Guardiões da Floresta, e agora esse outro ataque são crimes que estão relacionados aos conflitos por território, que é grande na região. Os indígenas estão defendendo com a própria vida suas terras”, concluiu Eloy.

Antônio Norberto, inspetor da Polícia Rodoviária Federal (PRF), disse que com a construção de uma base da corporação na cidade de Barra do Corda, é possível reforçar o combate a crimes como assaltos naquele trecho da BR-226.

“Está em construção uma unidade operacional, que é um reivindicação antiga, inclusive da Justiça. A previsão de finalizar esta obra é pra 2020 e vai ser muito bom, pois vamos conseguir melhorar o policiamento naquela região”, disse Norberto.

Oficialmente, a polícia não divulgou ainda qual foi a motivação do crime. A Polícia Civil informou que encaminhou o relatório do princípio da investigação à Polícia Federal. A PF, por sua vez, divulgou nota dizendo que está trabalhando e caso e que a outra investigação sobre as mortes do indígena Paulo Paulino e do madeireiro Márcio Gleyck Moreira Pereira está perto de ser concluída.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *