Recados para ela

Olá, minha fofa, muito bom dia! Espero que estas poucas e mal traçadas venham a encontrá-la na santa paz do nosso Criador. Por aqui, Bibi, te confesso que meu domingo não está legal. Perdi dois amigos no meio da semana e ando um pouco acabrunhado. Vão te encontrar por aí. Receberam o chamado celestial e nada se pode fazer. Só nos resta ficar aqui lamentando a distância, a falta da presença.

Vou te relatar aqui, tintim por tintim a situação.

No último dia 20, Dia do Poeta, perdemos um dos maiores deles, o meu amigo Cunha Santos. Além de poeta, jornalista e escritor, autor de várias importantes obras nos gêneros da crônica e da poesia. Morreu vítima de problemas decorrentes do coração.

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Poeta, jornalista, boêmio de boa cepa e um grande e excelente amigo. Não tinha rixa com seu Ningas, o que é muito difícil por aqui em se tratando de jornalista que milita na seara da política.

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Conheci o Cunha Santos em 1979, por ocasião da histórica Greve dos Estudantes que abalou São Luís. Era muito conhecido e querido na cidade. No ano anterior, havia lançado o seu primeiro livro “Meu Calendário em Pedaços” – Poesias.

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Em 1984, moramos no mesmo bairro (Monte Castelo), e aí nos aproximamos mais. De vez em quando nos reuníamos para uma rodada. Foi nesse ano que ele relançou tanto a primeira obra como Paquito, o Anjo Doido, num sarau na casa do saudoso Marinaldo Gonçalves, no Bairro de Fátima.

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Os convidados se foram e ficamos nós três comemorando o lançamento e dando vasão à boemia. Cismamos de ver o sol nascer e continuamos a farra na barraca do Antônio, na feira do bairro, até não aguentarmos mais.

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Esses foi um dos primeiros grandes porres entre eu e o grande poeta. Em 1988, mudamos para o Parque dos Nobres. Ali, fomos vizinhos. Dá para imaginar o que sempre acontecia.

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Costumávamos alternar os domingos. Um na minha casa e outro na casa dele. Como tocava violão, o grogue sempre era bastante animado. Lembro de um aniversário dele, que a comemoração começou na sexta e terminou no domingo, sempre com a participação do Lourival Bogéa, do Jornal Pequeno. Nesse tempo ele trabalhava lá.

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O Cunha excedia muito na birita. Certa vez ele estava direto há 8 dias. Passou mal. A então sogra dele, Dona Antônia me acordou no meio da noite.

-O Cunha está passando mal, tem que ser levado ao hospital!

O levei para o Socorrão I, onde o médico que o atendeu era amigo dele, lá do São Cristóvão. Disse que ia interná-lo. Ele começou a chorar, dizendo que não podia ficar sem olhar suas popoletas (três filhas).

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Tomou uns quatro soros e se recuperou. Estava apenas desidratado. Dois dias depois estava no bar do Raimundo Filho (outro que já se foi), deixando a então esposa, Cesarina com as mãos na cabeça.

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Naquela época, um dos sucessos do Carnaval eram os discos de vinil lançados geralmente no mês de dezembro, com os sambas de enredo das escolas de samba. Assim que chegavam na loja, era um dos primeiros a comprar. Chamava o Cunha lá em casa para analisarmos quais os melhores.  Ele avaliava a letra e eu a melodia.

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Pura desculpa para um goró sem fim. Acabávamos transformando a sala e o terraço num sambódromo improvisado. Nessas ocasiões, depois da sexta cerveja chamávamos outros amigos das redondezas e a história só acabava noite adentro.

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O tempo passou, me separei da esposa e ele também. Cada um buscou bairros diferentes para morar. Com a atual esposa, Cristina, estava morando na Vila Inah Rego, ali próximo ao Largo dos Remédios, quando aconteceu um episódio.

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Costumava levantar às 5 da manhã para comprar jornais na João Lisboa, aos domingos. Certa vez chego lá, compro os matutinos e me dirijo ao extinto Abrigo. O Cunha estava cochilando do lado de fora da barraca do Nhozinho, com uma garrava de cerveja pela metade ao lado.

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O Luís Galinheiro, outro que já virou saudades e que trabalhava no jornal O Debate, me  mostra o Cunha. Disse que ia levá-lo em casa. Quando colocamos o poeta no carro, ele prontamente se restabeleceu e disse que o dia dele estava ganho, porque iria continua a farra, agora com os dois amigos.

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Não estava a fim de beber. Quando chegamos na casa do cidadão, ele foi logo dizendo para a Cristina que queria ver o cachorro, pediu uns cd,s uma carteira de cigarro e disse que ia apanhar um litro de uísque.

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Pelo semblante da esposa, percebi que não era uma boa pedida ficar por ali. Fui embora, o Galinheiro ficou, não sei o que aconteceu depois. São lembranças minhas com o Cunha, que jamais se dissiparão.

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Quando a Elineusa o conheceu, foi amizade à primeira vista. O levei ao apartamento e tomamos um grogue. Antes da alta temperatura etílica, conversamos sobre política, poesia, música e outras amenidades.

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Ela se encantou com o alto grau de cultura do cidadão, que, na minha opinião, dessa geração foi um dos melhores. Deveria estar ocupando uma cadeira na Academia Maranhense de Letras. Bagagem para isso ele tinha, mas, pelo visto, esse sodalício virou casa de políticos.

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Também perdemos, Bibi, a prefeita de Cajari, Maria Félix Santos, esposa do juiz de Direito Osmar Gomes e mãe do presidente da Câmara Municipal de São Luís, vereador Osmar Filho.

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Ela faleceu na última sexta-feira, no Hospital Sírio Libanês, em Brasília. Estava há algum tempo em tratamento contra um câncer. Era uma figura muito carismática e querida por todos.

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Pela primeira concorreu e venceu para a Prefeitura daquele município. A conheci em 1994, quando o marido dele era chefe de Gabinete da Câmara de São Luís, na gestão de João Evangelista.

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Bem, minha fofa, com essa o teu pretinho vai ficando por aqui, garantindo retorno na próxima semana, se Deus quiser. E ele quer, porque sempre foi bacana com esse teu pimpolho.

Beijão de quem continuará te amando para sempre.

Djalma

N.E. Bibi é Benedita Rodrigues, mãe desse editor. Ela faleceu no dia 8 de dezembro de 1965, aos 28 anos de idade, na Santa Casa de Misericórdia.

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