Inesquecível entrevista com Elba Ramalho

 Era uma modorrenta noite de segunda-feira, no segundo semestre de 1984. Havia sido pautado pela editoria de cultura do extinto Jornal de Hoje para entrevistar Elba Ramalho, cujo show estava programado para a noite seguinte, no estádio municipal Nhozinho Santos.  Ela estava hospedada no antigo Hotel Vila Rica, atualmente Grand São Luís Hotel, na Praça Dom Pedro II, ao lado da Arquidiocese.

Fui preocupado. Pensava que era uma dessas artistas cheia de estrelismo, cujas frescuras ultrapassam a raia do absurdo. Ledo engano. Descobri uma estrela de primeira grandeza, tanto pelo talento como pelo caráter. Melhor surpresa ainda pela companhia com outros dois entrevistadores. O saudoso Mário Jorge Muniz, que atuava na Rádio Timbira e no O Imparcial e Cláudio Farias, cujo veículo em que trabalhava n ao me vem a memória.

Foi uma entrevista memorável. Falou-se mais de política do que do show, o que chegou a provocar a intervenção da empresária da artista. Tudo tinha razão de ser. Elba Ramalho, essa paraibana arretada, é uma mulher engajada, que emergiu oriunda do teatro amador e de movimentos populares.

1984 foi um ano marcante para a política nacional. Foi o ano dos históricos movimentos pelas Diretas Já, sob a liderança de Ulysses Guimarães, Leonel Brizola, Mário Covas, Fernando Lyra, Luís Inácio Lula da Silva, Fernando Henrique Cardoso e tantos outros expoentes da esquerda brasileira no período.

A conversa entre nós quatro girou foi por aí. Estava numa ressaca daquelas brabas, como resultado de uma domingueira num sítio na zona rural de São Luís. Até o cheiro de qualquer bebida alcoólica estava a me provocar náuseas.

O Mário Jorge e o Cláudio Farias não eram chegados a grogue. Elba descontraiu mais ainda o ambiente e pediu uma cerveja. Outras viriam a seguir, temperando a gostosa conversa. Ela criticou os militares, mostrou-se entusiasmada com as eleições diretas que não viriam naquele período e se disse fã do Ulysses Guimarães.

Entre um e outro generoso gole de cerveja, Elba soltou a sua afiada língua. Deixou escorregar a blusa tomara-que-caia, para nosso prazer dissimulado e nos envolveu com sua simpatia e generosidade. Jamais esquecerei a entrevista. O show, no dia seguinte, foi melhor ainda. O músico maranhense Zé Américo compunha sua banda e ela pintou e bordou com um alegre público no Nhozinho Santos.

Dá saudades de conversar com essa artista ainda em plena atividade e fazendo muito sucesso. Contratas com as cantoras que estão surgindo. Suas entrevistas, geralmente se resumem a explicar se são ou não bissexual, coisa que está virando moda.

Caso contrário, se esmeram em mostrar  que são boas de cama, com quanto já foram para a cama e por aí vai. Teve uma aí no Rock In Rio, que subiu ao palco   sem nada da cintura pra cima. No dia seguinte reclamou na mídia porque a produção do espetáculo não a filmou do jeito que queria.

Tem uma certa Joyo Todinho, cuja natureza não lhe foi nada benéfica, mas anda fazendo sucesso com músicas de sentido duplo e chulo palavreado  quando encara um jornalista. Ainda bem que nesse Rock In Rio, Elza Soares, do alto de seus 90 anos e nossa querida Alcione salvaram a pátria com belos espetáculos, onde se sobressaíram exatamente o que se espera de artistas. Talento, respeito e seriedade.

 

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